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Elas se qualificam e empreendem cada vez mais

Conheça histórias inspiradoras de mulheres alagoanas empreendedoras, marcadas pela sororidade
Aniete Rocha, Rose Ramos, Margíria Mercia e Marília Rocha: mulheres que empreendem (fotos: Severino Carvalho e Douglas Júnior)

Aniete Rocha, Margíria Mercia, Rose Ramos, Marília Rocha … O número de mulheres empreendedoras em Alagoas cresce ano após ano e já ultrapassa a marca de 96,7 mil, aumento de 15,99% em relação ao ano passado, segundo dados da Junta Comercial do Estado de Alagoas (Juceal).

O cenário em terras alagoanas é uma amostra do que acontece no Brasil, quando o assunto é empreendedorismo feminino. O país tem 10,4 milhões de mulheres empreendedoras, recorde histórico e crescimento de 33% nos últimos 10 anos, conforme levantamento feito pelo Sebrae Nacional com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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O economista Lucas Sorgatto avalia que a evolução do empreendedorismo feminino, como uma crescente nos últimos anos, é resultado de fatores históricos e socioeconômicos.

“As mulheres estão assumindo cada vez mais uma posição de mantenedora da família, não somente como complemento de renda mas, também, como posição de chefia”, destaca.

Fonte dos dados: Juceal / Sebrae / IBGE

Seja por escolha ou necessidade, elas estão aí! Atuam como microempreendedoras individuais (MEIs), sócias, administradoras e empresárias, superando os desafios do mercado ou o “simples” fato de ser mulher, em mercados ainda dominados pelos homens. Qualificam-se e buscam mais do que renda: lutam por autonomia e voz.

Aniete Rocha, Margíria Mercia, Rose Ramos, Marília Rocha… A lista citada na abertura desta reportagem traz histórias de empreendedorismo distintas, mas que se entrelaçam, tendo como fios sustentadores a capacitação e o sentimento de sororidade: união e apoio mútuo.

Mais que um coworking, conheça a N3!

Empreendedorismo que gera empreendedorismo! Assim se pode definir a N3 Coworking (@n3coworking), das sócias Aniete Rocha e Margíria Mercia, duas experientes arquitetas que queriam não apenas um escritório convencional, ansiavam por empreender.

E elas foram além: criaram mais do que um coworking, um espaço físico compartilhado com 56 estações de trabalho, auditório, salas multiuso. Inovaram ao instituir uma escola de empreendedores, cujo programa guia e acelera pessoas – a maioria mulheres – rumo ao sucesso, ofertando suporte em todas as etapas do negócio.

“A gente não inventou a roda. A gente pegou o processo que a gente passou e botou em linha reta. O coworking é espaço de trabalho compartilhado, mas é também rede, apoio, suporte pra quem quer empreender. A ideia era sair do escritório de arquitetura tradicional e virar empresa. A N3 nasceu disso”, explica Mercia.

Aniete e Mercia: arquitetas que queriam não apenas um escritório convencional, ansiavam por empreender (foto: Douglas Júnior)

Ela conheceu Aniete em 2015 durante a CASACOR, plataforma de arquitetura, design de interiores e paisagismo com mostras espalhadas pelo Brasil e o exterior. Aniete também tinha a inquietação de sair das linhas que a prendiam ao formato tradicional da arquitetura.

“Quando paro para refletir sobre a trajetória da N3, lembro que em muitos momentos foi desafiadora, mas no geral uma trajetória linda. Nos conhecemos em um momento de muito desafio, o que era para nos afastar nos aproximou – e isso foi em 2015, atuando com arquitetura. Iniciamos a empresa já pensando em possibilidades ‘fora da caixa’ e isso nos colocou diante de muitos desafios e descobertas, ajustes de rotas e aproveitamento de oportunidades”, recorda Aniete.

“Piolho de Sebrae”

Juntas, elas venceram o prêmio de “Ambiente mais funcional” da CASACOR 2015. Também juntas, decidiram procurar o Sebrae para entender melhor como empreender na área da arquitetura.

As empreendedoras contam que isso foi fundamental na transição de escritório para a empresa: participaram de todos os cursos e mentorias gratuitas disponíveis. Depois, passaram a investir em cursos pagos e consultorias.

“A gente era ‘piolho’ de Sebrae. Tudo que fosse de graça, a gente ia”, brinca Mercia. “O Sebrae ajudou muito, a gente não sabia nem o que era empreender. Hoje, orientamos os empreendedores sobre qual curso fazer primeiro, depois o segundo, depois o terceiro”, pontua.

Mercia: “A gente era ‘piolho’ de Sebrae. Tudo que fosse de graça, a gente ia” (foto: Severino Carvalho)

E foi aproveitando uma oportunidade que surgiu a N3 Coworking. Elas receberam a proposta do Parque Shopping Maceió e decidiram encarar o desafio de montar o espaço, que hoje funciona no Piso L3.

“Era algo muito novo, mas partimos para a ação! Em muitos momentos aprendendo na hora com situações que a N3 Coworking foi nos colocando. Abrimos em janeiro de 2019 e em março tivemos o triste momento com a Covid e o diagnóstico de câncer de mama da minha sócia, Margíria Mercia”, recorda Aniete.

“Nossa jornada empreendedora testou de fato nossa resiliência. E esse processo nos levou a definir a nossa missão, que é guiar e dar suporte na trajetória de empreendedores, e a idealizar um meio que facilitasse esse caminho para quem empreende, hoje a N3 Acelera”, acrescenta.

N3 Acelera e o domínio feminino 

O N3 Acelera é um programa integrado que ensina em 4 meses tudo o que é preciso fazer para criar ou alavancar um negócio de forma efetiva: da ideia inicial ao lançamento ao mercado.

Iniciada em 2022, a iniciativa já conta com três turmas finalizadas e cerca de 50 negócios impactados positivamente, das mais variadas áreas. A última delas foi finalizada no dia 15 de abril deste ano.

Na ocasião, 19 negócios disruptivos, artesanais, gastronômicos e até de bem-estar íntimo se apresentaram na terceira edição da mostra “Empreendedores que Aceleram”.

Aniete: “Era algo muito novo, mas partimos para a ação!” (foto: Douglas Júnior)

O recorte por gênero da turma só ratifica os números gerais sobre o crescimento do empreendedorismo feminino em Alagoas. Dos 19 negócios apresentados, 16 são comandados por mulheres, o que representa um percentual de 84,25% do total.

“Hoje, a mulher tá se empoderando, uma tá puxando a outra. Antes, a relação era de competição, hoje já virou um ambiente de estímulo. E isso tem tudo a ver com sororidade, com certeza”, avalia Mercia.

O N3 Acelera conta com o apoio do Sebrae e do Parque Shopping, que fornecem bolsas a mulheres em situação de vulnerabilidade social que desejam empreender. A própria N3 também oferta o auxílio.

“Eu não tinha percebido que tantas mulheres olhavam pra gente como um guia. Muita gente chega e diz: ‘Fiz isso porque vi você’. Isso vale mais do que dinheiro: ver uma mulher mudar de vida porque passou pelo nosso programa”, conclui Mercia.

A ressignificação de Rose

Mãe atípica, Rose Ramos, 52 anos, é bióloga por formação, com mestrado e doutorado. Carioca, veio morar em Alagoas em 2005 com o marido, também professor universitário.

Em 2018, ela teve de se afastar do trabalho devido a problemas nas cordas vocais e laringe, que a impediam de projetar a voz em sala de aula. O filho mais velho (21 anos), autista de suporte 3, com deficiência intelectual severa, exigia de Rose cuidados mais intensivos em casa, à medida que crescia e não conseguia mais acompanhar a escola regular.

Com o apoio do marido, ela pediu demissão para se dedicar aos filhos, sobretudo ao mais velho, devido à falta de autonomia deste.

Além dele, ela tem outros três filhos: um com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDH), outro com Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e uma menina, a única neurotípica, que possui desenvolvimento neurológico típico.

Para Rose, empreender nasceu da necessidade e a partir de um fato inusitado. A mochila do filho de 20 anos, que frequenta a escola, rasgou. Com renda diminuída, ela decidiu confeccionar uma bolsa utilizando a calça jeans usada e que não mais lhe cabia. Ela havia feito uma cirurgia bariátrica e perdeu medidas.

“Achei um vídeo na internet, que era até em inglês. Mas o cara dava um molde de uma mochila. Aí eu imprimi, cortei nas calças e costurei. Claro, não foi de primeira, né? Costura, descostura, mas saiu a mochila. Ele gostou, ficou contente, levou para a escola; os colegas também gostaram. Aí eu falei: ‘pô, esse negócio é legal’. Aí já tinha as calças lá mesmo, comecei a cortar”, recorda Rose.

E assim nasceu a Ressigna Acessórios em upcycling de jeans, um negócio de impacto socioambiental que produz bolsas e acessórios sustentáveis, com um trabalho manual, feito a partir do reaproveitamento dessas peças em desuso.

Upcycling é o processo criativo que consiste em dar uma nova vida a materiais e objetos que seriam descartados.

Rose criou a Ressigna Acessórios em upcycling de jeans (foto: Severino Carvalho)

“Nós transformamos o descarte em matéria-prima para as nossas peças e combinamos com técnicas artesanais. O nosso principal objetivo é diminuir o impacto ambiental negativo que é gerado por esse descarte têxtil e impactar de forma positiva a vida de várias pessoas, porque nós destinamos parte do lucro das nossas vendas para ações que são em prol de crianças e famílias em situação de vulnerabilidade”, explica Rose.

Ela começou a comercializar suas peças em 2023, participando de feiras de rua e outros eventos, através do apoio do Sebrae. Para aprimorar o negócio, participou de diversas ações como o programa de pré-aceleração “Efeito Furacão”, promovido em parceria com a Be.Labs, e da feira “Seu Negócio é um Espetáculo”.

Rose também foi uma das 16 empreendedoras que participaram da última edição do N3 Acelera, por meio de uma bolsa de incentivo concedida pelo Sebrae Alagoas. Microempreendedora individual, ela fala da importância das capacitações para o crescimento e fortalecimento da Ressigna.

“Essas capacitações foram, assim, fundamentais, na verdade. O meu negócio nasceu no Sebrae e cresceu no N3. Então, sem esse apoio talvez o meu negócio nem existisse, porque nem eu mesma acreditava que isso podia dar certo. Hoje, eu acredito, e tenho muito orgulho do meu negócio”, celebra Rose.

Os canais de venda de Rose são o Instagram (@ressignabr), o WhatsApp (82 987613747) e as feiras e eventos.

Inovar é preciso: dos jogos e brinquedos pedagógicos à loja colaborativa

Inovar faz parte da jornada empreendedora de Marília Rocha, 36 anos. Formada em Matemática, ela fez as contas: largou a sala de aula e se lançou no mundo dos negócios.

Com outras duas empreendedoras, divide o espaço e as despesas na loja colaborativa L’atellier Collab, na Avenida Rotary, 317-E, Gruta de Lourdes, em Maceió.

“A principal vantagem de uma loja colaborativa é a divisão de custos. Além de dividir o espaço, a gente divide todas as despesas: aluguel, água, luz, internet, publicidade. Cada uma vem um dia na semana ou dois para abrir a loja. O endereço físico se torna uma referência para o cliente e, ao meu ver, gera mais credibilidade”, avalia Marília, com a consciência de quem conhece bem os números.

Ela é dona da Entressonhar Jogos e Brinquedos Pedagógicos (@entressonhar_brinqpedagogicos). A exemplo de Rose Ramos, seguiu a trilha do conhecimento, participando de cursos oferecidos pelo Sebrae Alagoas. Também fez parte da turma mais recente do N3 Acelera.

Marília: “A principal vantagem de uma loja colaborativa é a divisão de custos” (foto: Severino Carvalho)

Marília, que se considerava tímida e “travava” ao falar do negócio, agora está mais desenvolta, comunicativa.

“Eu já consigo falar melhor. Eu tinha essa timidez que travava, não conseguia falar muito sobre o meu negócio. E aí a capacitação na N3 ajudou a quebrar essa barreira.

Ela conta que participar do N3 Acelera a fez ter outra visão do negócio, o que proporcionou um crescimento ainda maior, tanto do ponto de vista empresarial como pessoal.

“Participar do N3 me fez superar medos e dificuldades, tanto de forma pessoal quanto no meu negócio, para o crescimento dele mesmo. Empreender, para mim, foi uma grande mudança e uma grande oportunidade. Uma oportunidade, realmente, de criar, de aprender e de ajudar ao próximo com o meu trabalho”, pontuou.

Os brinquedos produzidos por Marília são feitos em tecido e feltro. O intuito é promover habilidades motoras e cognitivas.

“A Entressonhar é uma marca focada na personalização: você escolhe, você pensa uma necessidade, a habilidade que você queira desenvolver, tanto na criança ou no idoso. E eu criei os brinquedos em cima dessa necessidade, que você queira. Trabalhamos com a pronta-entrega ou por encomenda”, explica.

Ela tem um conselho às mulheres que desejam empreender o que estão desanimadas com o negócio: “Não desistir dos seus sonhos. Se você gosta do que você faz, persista. Às vezes não é fácil, a gente vai para um evento e não vende nada. Aí fica meio desanimada, mas é não desistir, persistir. E sempre buscar se capacitar”, conclui.

Sebrae Delas

Para a analista do Sebrae Alagoas, Érica Pereira, o crescimento do empreendedorismo feminino em Alagoas é um reflexo do talento, da resiliência e da determinação das mulheres.

Nesse contexto, Érica afirma que o Sebrae Delas desempenha um papel fundamental no fortalecimento do empreendedorismo feminino em Alagoas. O programa oferece capacitações, mentorias, consultorias e eventos estratégicos que incentivam e apoiam mulheres empreendedoras em todo o estado.

“Em 2024, o programa chegou a atender mais de 2.600 mulheres em 72 municípios alagoanos, promovendo o desenvolvimento pessoal e profissional das participantes”, destacou a analista.

“O Sebrae Delas continuará a ser um aliado estratégico, oferecendo suporte e oportunidades para que mais mulheres possam realizar seus sonhos empreendedores”, acrescenta.

Érica: “O Sebrae Delas continuará a ser um aliado estratégico” (foto: Agência Sebrae-AL)

Érica explica que o Sebrae Delas é voltado a empreendedoras que já possuem um negócio ou estão em fase de formatação. O programa oferece, ao longo do ano, consultorias, capacitações, mentorias, workshops e eventos que visam fortalecer a cultura empreendedora entre as mulheres e promover parcerias entre elas.

“Para 2025, o Sebrae Delas planeja ampliar suas ações, fortalecendo ainda mais o apoio às mulheres empreendedoras em Alagoas. As novas iniciativas incluem a expansão das capacitações para os grupos subrepresentados e parcerias estratégicas para facilitar o acesso a crédito e mercados”, finaliza.

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