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Estudo sobre peixes-bois favorece criação e manejo de unidades de conservação

Artigo de pesquisador alagoano monitorou 38 animais para entender a necessidade de espaço desses megaherbívoros
Área de estudo compreendeu a costa do Nordeste brasileiro, com dados utilizados de animais capturados em quatro subáreas, desde o Ceará até a Bahia (foto: Severino Carvalho)

Um peixe-boi (Trichechus manatus), megaherbívoro marinho ameaçado de extinção, necessita de uma área de vida de cerca de 72,96 km², em média, e se desloca por 14,74 km por dia, para desempenhar suas funções ecológicas. É o que revela artigo publicado, em maio, na revista científica internacional Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecossystems, de autoria do mestre e doutorando em conservação da biodiversidade tropical, o alagoano Iran Campello Normande, 43 anos. O estudo tem coautoria de outros 10 cientistas.

De acordo com a pesquisa, entender a necessidade de espaço por esses animais é essencial para a formulação de políticas de conservação, baseadas em área, como as Unidades de Conservação da Natureza (UCNs), a exemplo da Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, entre os litorais sul de Pernambuco e Norte de Alagoas, e habitada pelo peixe-boi marinho.

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O artigo integra a tese de doutorado de Normande junto ao Programa de Pós-Graduação em Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos (PPG-DIBICT) da Universidade Federal de Alagoas. A pesquisa utiliza um extenso banco de dados de monitoramento por satélite de 38 peixes-bois para entender a necessidade de espaço destes megaherbívoros marinhos, bem como busca compreender que fatores internos e externos influenciam esta necessidade.

“Para conservarmos espécies ameaçadas de extinção precisamos entender, entre outras coisas, em que ecossistemas elas ocorrem, que habitats utilizam, se elas necessitam de grandes áreas ou se ficam restritas a espaços mais restritos. Assim podemos propor a criação ou o manejo de unidades de conservação de forma que seja possível proteger estes habitats importantes”, explica Normande, que é analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Foto / arte: Severino Carvalho

A área de estudo compreendeu a costa do Nordeste brasileiro, com dados utilizados de animais capturados em quatro subáreas, desde o Ceará até a Bahia.

“Após capturar os peixes-bois e marcá-los com rastreadores por GPS, utilizamos um método chamado Estimativa de Densidade Kernel Autocorrelacionada para estimar as áreas de vida. Mas antes, aplicamos uma máscara gerada por aprendizagem de máquina para excluir áreas em terra ou muito profundas, sabidamente não utilizadas pelos peixes-bois. A conjunção destes métodos nos permitiu realizar estimativas mais precisas, além de entender que fatores influenciam o tamanho da área de vida”, conta Normande.

Pesquisa utiliza um extenso banco de dados de monitoramento por satélite de 38 peixes-bois para entender a necessidade de espaço destes megaherbívoros marinhos (foto: ICMBio)

Extremo sul

Ele chama a atenção para o fato de Alagoas, atualmente, representar o extremo sul da distribuição dos peixes-bois.

“Este fato aumenta a importância do estado, pois populações localizadas no extremo da distribuição são mais susceptíveis à extinção. Além disso, a maior parte dos dados utilizados foram coletados em Alagoas e os resultados podem ser aplicados para a criação de novas unidades de conservação no estado ou para o zoneamento da APA Costa dos Corais, que é uma importante área para estes animais”, ressalta Normande.

Artigo que integra a tese de doutorado de Normande foi publicado na revista científica internacional Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecossystems (foto: Severino Carvalho)

A pesquisa também concluiu que peixes-bois monitorados por longo prazo tendem a aumentar a área de vida com o passar do tempo. Outra conclusão é que animais reintroduzidos na natureza apresentam comportamento dispersivo e precisam de mais tempo para se estabelecer numa área.

“Nosso estudo contribui com o entendimento da ecologia do movimento dos peixes-bois e pode auxiliar sua conservação através da criação e manejo de áreas protegidas”, cita Normande.

Agregador

É comum muitos olharem para a figura desse animal corpulento, que pode chegar a medir 4 metros de comprimento e pesar até 600 kg, e pensá-lo de forma isolada.

Em torno do peixe-boi, entretanto, se desenvolveu, no Litoral Norte de Alagoas, toda uma atividade econômica, de base comunitária, que vai desde o turismo de observação do animal à produção artesanal de bichos de pelúcia e de outros objetos que se inspiram na figura afável do mamífero aquático.

O peixe-boi é um bicho agregador. Cumpre com o seu papel ambiental, fertilizando a costa brasileira. Mais do que isso: a sua simples presença por estas paragens desenvolveu nas comunidades o sentimento preservacionista não só do animal, mas de todo o ecossistema em que está inserido: a APA Costa dos Corais, maior unidade de conservação marinha e costeira do Brasil.

Fonte: Ecoa Lab

“Esperamos que este trabalho possa contribuir para que novas unidades de conservação sejam criadas e que as atuais sejam manejadas a partir de evidências científicas, ajudando a evitar a extinção dos peixes-bois e de tantas outras espécies menos percebidas pelo público, mas que também prestam importantes serviços ecossistêmicos”, conclui Normande.

O trabalho de pesquisa contou com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Petrobras, Grupo Fundação Boticário e da Fundação Toyota do Brasil. Foi realizado com dados do ICMBio e da Fundação Mamíferos Aquáticos.